Entenda o Diário de Obra

Quinta-feira, 26 de Julho de 2012
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Diário de obra pode ir além de mero cumprimento contratual e se tornar ferramenta de apoio na gestão da produção
 

        O diário de obra é um documento que deve ser preenchido com o registro das principais atividades diárias de um canteiro de obras, funcionando como uma espécie de memorial. Seu preenchimento, muito além de uma mera questão burocrática, pode ser uma fonte valiosa de informações para auxiliar as construtoras na gestão do canteiro. Nos diários são anotados os detalhes e a descrição dos serviços executados, o uso e a disponibilidade de recursos - como mão de obra e máquinas - e os avanços em cada atividade ou frente de trabalho. Também costumam ser registrados os problemas que impedem a execução dos serviços em alguma situação especial.
 

        O documento costuma ser um instrumento formal para registrar as atividades que estão acontecendo na obra, a cada dia (detalhes no boxe "Questões legais"). Em muitos contratos, há exigência de se ter o diário de obra para cumprir essa formalidade. É no diário de obras que se registra, por exemplo, que choveu e não foi possível executar uma fundação, podendo haver, por exemplo, um prolongamento do prazo para cumprir a obra.


        Além da função jurídica e contratual, o diário de obra também pode ser usado como um instrumento para registrar aspectos da obra que podem ser incorporados a sistemas de gestão de qualidade. "No diário de obras, pode-se colocar informações de costume e que o contrato demanda, além de ocorrências que possam ajudar no entendimento do que ocorreu na obra, auxiliando a gestão", diz Ubiraci Espinelli de Souza, professor da Poli-USP e diretor da Produtime Gestão e Tecnologia.


        A importância atribuída ao diário, tipicamente, é a de se ter um registro rigoroso das atividades realizadas diariamente em um único documento. Costumam constar a autoria dos serviços executados, o efetivo da obra, as ocorrências não previstas que causem interrupção nos trabalhos, os acidentes no canteiro, as condições climáticas, as locações de máquinas e equipamentos e a sua utilização no dia. O documento também pode ajudar no controle das Anotação de Responsabilidade Técnica (ARTs) e Registro de Responsabilidade Técnica (RRTs) dos fornecedores, por conta do registro de quem executou os trabalhos. "A assinatura do diário pelo cliente atesta o acompanhamento da obra, o que caracteriza transparência na relação entre as partes", afirma Maria Cecilia de Sá Fernandes, gerente de qualidade e segurança do trabalho da construtora Matec Engenharia.


        Para que o diário cumpra sua função é importante incorporar no canteiro o hábito de alimentar adequadamente o documento, com todos os serviços em execução e os locais. O diário registrado de forma rigorosa costuma ser o principal instrumento para esclarecer dúvidas futuras sobre a obra. "A dificuldade das empresas é manter um registro fiel e prático, com dados relevantes, pensando no registro da relação conmateria tratual", diz André Choma, engenheiro máster da Vale em Belo Horizonte, que trabalha na área de gestão de projetos de capital.

Marcelo Scandaroli

 

Na construtora Matec, diário de obra é uma das ferramentas de gestão usadas para avaliar a produtividade de cada equipe e a condição de cumprimento do cronograma


Funções do diário
Alvaro Cordeiro, diretor de construção da Tecnum Construtora, alerta que a importância do diário não está no documento em si, mas em sua aplicação. "Considero o diário uma ferramenta adequada. Mas para não se tornar uma ferramenta obsoleta, ele depende do uso da construtora", afirma. "Se existe outra ferramenta de controle das atividades e do efetivo da obra, o diário está dispensado - a não ser que seja uma exigência da incorporadora, pois o diário só é válido como documento se estiver indicado em contrato", explica.


       O diário de obra passa a ser uma ferramenta pouco útil quando é tratado de forma burocrática. Choma afirma já ter visto obras que contavam com apontadores cuja única função era anotar quem estava na obra naquele dia, e se estava chovendo ou não. "Essas informações são importantes, mas não valem o investimento em ter um profissional dedicado à tarefa. As empresas precisam estruturar seus controles para obter dados relevantes, que possam auxiliar em decisões gerenciais e que possam ser usadas em caso de disputa contratual", diz o engenheiro.


       Na construtora Matec Engenharia, o diário de obras é um documento essencial na gestão dos contratos e do pós-contrato. Na empresa, os diários de obra recebem auditorias mensais pela área de gestão de obrigações legais. Além disso, também é feita uma auditoria trimestral pela equipe de gestão da qualidade. Por meio de Fichas de Verificação de Serviços, que são alimentadas pela equipe de qualidade na obra, a construtora consegue identificar se os serviços estão sendo realmente registrados no momento real - as fichas e o diário não podem apresentar registros contraditórios. "Com essa ação, tivemos no último trimestre uma significativa melhoria na qualidade desse documento. E, consequentemente, um fiel registro da evolução da obra", afirma Maria Cecilia.


       Na Tecnum Construtora, o diário de obras integra o sistema de qualidade de gestão e segurança. "Ele é um documento desse sistema de gestão. Temos um procedimento de gestão das atividades administrativas da obra e o diário é um anexo desse procedimento", diz Cordeiro.


       Quando o contrato estabelece que o diário de obra é o documento oficial para registro de ocorrências, é necessário anotar tudo que atrapalhe a execução da obra, todas as interferências negativas. Cordeiro afirma que um representante da gerenciadora ou do contratante pode visitar e, eventualmente, acrescentar informações ao diário. Caso esse representante não esteja na obra, um procedimento comum é fazer essa validação por e-mail.


       As responsabilidades - se houver - sobre cada imprevisto ficam anotadas e reconhecidas no diário. Assim, em caso de adiamento da obra ou incompatibilidade de informações, o documento pode atestar quais interferências impediram determinado serviço.


Aplicações dos registros
Além do registro documental, as informações anotadas no diário podem ter outras aplicações. Para o engenheiro Choma, é importante manter um plano de ação para atender às demandas levantadas pelo registro no diário. "A partir do diário nascem, por exemplo, pedidos de mudanças nos serviços e no contrato, notificações por descumprimento de normas de segurança do trabalho, entre outros", diz.


        Como no diário de obra se registram as anormalidades da obra, as informações podem ser usadas para complementar o acompanhamento da produtividade. "Normalmente, não é no diário que eu vou registrar quantos homem-hora trabalharam e qual foi a quantidade de serviço para gerar uma informação de produtividade. Você deve usar outro instrumento para isso", esclarece Espinelli. Entretanto, segundo o professor da Poli-USP, as anormalidades respondem por 5% até 35% da variação da produtividade. "Portanto, nesse aspecto, o diário de obra passa a ser um lugar bem interessante para acompanhar esses dados", diz. As anormalidades registradas podem servir tanto para fins legais - cobrar os atrasos de um terceiro, se for o caso - quanto para a gestão da produção, sendo o diário uma fonte de entendimento para checar possíveis origens das falhas na produtividade.


        Pode-se criar outras ferramentas para o registro das anormalidades. Mas o diário de obras é, por excelência, o documento onde se costuma anotar esses problemas. "Nele, você pode incluir parâmetros para indicar melhor qual a força e a influência que a anormalidade teve. Isso facilita o uso para fins de análise de produtividade", completa Espinelli.


        Na Matec Engenharia, os dados registrados no diário de obras são usados para levantar estatísticas dos trabalhos executados. Os dados extraídos podem ser usados para avaliar a produtividade de cada equipe e a condição de as equipes definidas atenderem ao cronograma. Com base nas anotações, a empresa toma decisões sobre a necessidade de reforço das equipes e também, posteriormente, utiliza os dados para avaliação do prestador de serviço.


        Maria Cecilia, gerente de qualidade e segurança do trabalho, dá um exemplo recente de aplicação das informações do diário. A empresa alocou um fornecedor para determinado serviço e, na contratação, estava bem-especificado o prazo para execução - com cronograma do serviço anexado ao contrato, o efetivo que a empresa concordou ser o necessário para cumprir o contrato, os equipamentos e demais informações. "Após uma semana de alocação do fornecedor, ficou registrado - além dos registros que o apontador faz diariamente do efetivo de cada empresa e da nossa própria empresa - o número de profissionais disponibilizados dia a dia pela empresa e os serviços que efetivamente foram realizados", afirma. Os registros serviram como elemento de análise de que, para recuperação da produção conforme cronograma da obra, era preciso um reforço imediato - ou por parte do mesmo fornecedor ou por meio de contratação de outro fornecedor para distribuir o mesmo serviço. "Neste caso, o nosso fornecedor não teve como mobilizar mais equipe e tivemos todos os argumentos e evidências de que o combinado não foi cumprido, levando-nos a contratar outra equipe para complementação do serviço dentro do cronograma da tarefa", completa Maria Cecília.

 

Entenda as principais questões legais relacionadas ao Diário de Obra e suas diferenças e semelhanças com o Livro de Ordem

O Diário de Obra é obrigatório?
O diário pode ser uma exigência expressa no contrato entre a contratante e a prestadora de serviço. Além disso, o Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea) tornou obrigatório um documento similar ao diário de obra por meio da Resolução 1.024. Essa Resolução obriga o uso de um documento - chamado de Livro de Ordem - em todas as obras e serviços executados por profissionais do sistema Crea/Confea.

No Livro de Ordem, devem necessariamente constar itens típicos dos diários de obra, como: datas de início e de previsão de término da obra ou serviço; datas de início e de conclusão de cada etapa; nomes de empreiteiras ou subempreiteiras com suas respectivas atividades e encargos; períodos de interrupção dos trabalhos e seus motivos; entre outras informações listadas na Resolução. Algumas construtoras já levam isso em conta, colocando em seus diários de obra todos os itens que a resolução do Confea exige.

Qual a finalidade legal do diário?
Se sua necessidade for expressa em contrato, o diário serve como documento oficial para diversos fins - como conflitos e atribuições de responsabilidade entre contratante e contratada. Segundo a Resolução do Confea, o Livro de Ordem serve para comprovar autoria de trabalhos, garantir o cumprimento de instruções técnicas e administrativas, dirimir dúvidas sobre orientações técnicas, avaliar motivos de eventuais falhas, gastos imprevistos e acidentes de trabalho, além de ser eventual fonte de dados para trabalhos estatísticos.

Quais as penalidades para quem não usá-lo?
De acordo com a Resolução do Confea, a falta do Livro de Ordem implica apuração a uma infração contra um dos itens da Lei Federal 5.194 - empréstimo de nome a serviços sem real participação - e contra o código de ética profissional da área. Se confirmadas as infrações, as penalidades previstas na lei federal são de advertência e multa.

Quem pode exigir o diário de obras preenchido?
Apesar de a Resolução do Confea obrigar a implementação do Livro de Ordem desde 1o de janeiro de 2011, os Creas de cada Estado devem homologar seus livros junto ao conselho federal. Até o momento, segundo a assessoria de imprensa do Confea, somente o Crea-DF tem seu Livro de Ordem homologado. Na prática, os Creas dos demais Estados - a quem cabe a fiscalização do uso do Livro - não podem exigir o documento.

 


Preenchimento
Normalmente, o preenchimento do diário pode ficar a cargo do engenheiro ou a cargo de um técnico ou estagiário - mas sempre com a supervisão, orientação e aprovação do engenheiro responsável. É importante que os profissionais envolvidos tenham consciência da importância das informações ali registradas, para que o registro seja útil e válido para controle do contrato da construtora com o cliente e com os empreiteiros. "É importante lembrar que, para cada relação contratual, precisamos manter um diário separado, pois a outra parte - seja cliente ou empreiteiro - também tem que assinar quando houver ocorrências", diz Choma.


        Na maior parte dos casos, como na Tecnum Construtora, o diário é em papel. "Ele é um livro, que pode ser acessado por qualquer pessoa envolvida e interessada. Um representante do incorporador, por exemplo, pode ter algum interesse específico e pode acessar o diário na obra", diz Cordeiro, diretor de construção da empresa. "É interessante que o engenheiro da obra realmente acompanhe o diário - que ele saiba, por exemplo, que a obra está contando com 15 carpinteiros naquele dia para tomar as decisões dele", completa.


        Na Matec, o documento é preenchido diariamente pela engenharia de produção e assinado pelo gerente do contrato. É emitida uma cópia para o cliente, que recebe semanalmente todos os registros para que sejam assinados e devolvidos para a construtora. "Todos os profissionais de produção e gestão da obra têm acesso ao diário. Não é necessário, para nós, um treinamento especial para preenchê-lo - mas para maior clareza no preenchimento disponibilizamos um modelo do documento", explica Maria Cecilia.


Como preencher o diário?


IF Catarinense
O diário de obra é, normalmente, um documento oficial entre o contratante e a contratada. Nele, são registradas, diariamente, informações como: recursos humanos na obra no dia, por especialidade; tipo de atividades que estão sendo executadas; principais entradas de materiais ou equipamentos no dia; decisões tomadas e mudanças; condições do tempo; eventuais impedimentos de frentes de serviço; outras informações relevantes (falta de recursos, falta de energia, paralisações, etc.). Normalmente, os campos de preenchimento já são dados para facilitar o procedimento. O texto deve ser claro, direto e sucinto - com detalhamentos somente dos pontos mais críticos e relevantes. Geralmente, no campo de observações e ocorrências são anotados pontos mais específicos que não cabem nos campos pré-formatados. Confira um modelo de diário de obra típico.



Marcelo Scandaroli
É importante que para cada relação contratual exista um diário separado e, quando houver ocorrências, a outra parte - cliente ou empreiteiro - deverá assiná-lo


        Na empresa, são registrados todos os serviços em realização, onde estão sendo realizados e os autores destas realizações. Cada equipe cria uma forma específica para que todos os dados sejam contemplados - não é necessária uma padronização rígida. Quando a obra tem um grande número de engenheiros na produção, um caderno para registro das atividades sob responsabilidade de cada um fica disponível e, ao final do dia ou no início do dia seguinte, todos os dados apontados por cada engenheiro são transferidos para o diário de obras por pessoa designada. Na própria Matec, algumas equipes preferem fazer o registro por apenas um profissional, que normalmente é o engenheiro responsável por todas as atividades em execução.
 

        Cordeiro recomenda que um auxiliar administrativo treinado para preencher o diário faça a tarefa, com o auxílio do mestre, pela manhã. As informações sobre a execução das atividades podem ser preenchidas ao longo do dia. Para o diretor de construção da Tecnum é interessante que, até o fim do dia, o diário esteja preenchido. "Preencher as informações no começo da manhã e complementar ao longo do expediente é bom, inclusive, porque você coloca as atividades que não foram concluídas no dia anterior e, durante o dia, acrescenta aquelas que forem iniciadas", afirma Cordeiro. Ele destaca, porém, que não há um procedimento ideal válido para todas as obras.


        Em alguns casos, construtoras que fazem obras de menor porte abrem mão de um documento diário. A construtora mineira Casa Mais, focada no segmento imobiliário econômico, utiliza em vez do diário de obra um formulário semanal. Para Edson Querino, engenheiro civil da empresa, a solução foi usada para economizar tempo de trabalho do encarregado na obra e, ao mesmo tempo, manter a construtora informada sobre o andamento dos serviços. Os itens relacionados nesse formulário estão presentes normalmente nos diários de obra padrão: serviços previstos para execução, serviços executados, e quantidade de funcionários na obra por tipo de função.

Fonte:

http://revista.construcaomercado.com.br/guia/habitacao-financiamento-imobiliario/132/artigo261970-2.asp







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