A proposta de revisão e atualização do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi) está atualmente em consulta pública no site da Caixa Econômica Federal (CEF). Para Luiz Freire de Carvalho, especialista e consultor em engenharia de custos, o trabalho é de inegável qualidade, resultado do esforço de técnicos de reconhecida capacidade no mercado. No entanto, o mercado revela preocupações a respeito do uso de tabelas e composições de custos padronizados como referência para projetos de diversas naturezas e tipologias. No artigo a seguir, ele apresenta alguns desses questionamentos e propõe uma metodologia alternativa de formação de preços. Confira o texto na íntegra:
Tabela de Custos referenciais:
da estruturação à caracterização e contingenciamento
O novo SINAPI, com o apoio da Universidade e de técnicos de reconhecida capacidade, que se pretende exaustivo, revisado, atualizado e estruturado, tem sua metodologia e composições de custos, em consulta pública oferecida por sua gestora, a CEF Caixa Econômica Federal, em seu site. O mercado revela preocupações centrais que podem ser conhecidas pelos questionamentos que se apresentam.
O SINAPI, que se define basicamente como uma tabela padrão referencial de custos de obras públicas, sob o amparo da LDO, seguirá contrariando essa definição e ditando o limite de custos de serviços de construção?
Uma composição de custos padrão referencial pode representar todas as tipologias, todos os projetos e contratos, todas as condições de execução, caracterizando a obra e todas as contingências a que estará submetida?
Nesse sentido, o SINAPI original, com fontes desconhecidas, fatores de desempenho desatualizados, sem o fundamento de premissas técnicas e de normas técnicas, "engessava" o mercado. O novo SINAPI, por sua inegável qualidade, mas com câmbio de personalidade e vício de uso, vai conduzir o mercado a uma "mordaça e camisa-de-força"?
Essa temática de tal ordem estratégica não deveria pertencer às atribuições de uma agência de controle de custos? Não poderia ser presidida pela CEF, com enfoque eminentemente técnico, muito além de bases exclusivamente financeiras e jurídicas, com participações representativas do mercado, da Universidade, dos Institutos de Pesquisa e destacadamente dos agentes de obras públicas?
E a imprensa populacional leiga continuará publicando, de modo sensacionalista e infundado, que tudo o que difere das tabelas de custos padrão referencial é superfaturamento?
Defendemos aqui o resgate da Engenharia, que se traduz em qualidade das obras, transparência dos processos e demonstrações técnicas incontestáveis, para o tratamento dessas questões, em oposição ao tratamento exclusivamente jurídico, ao planejamento adaptativo do Estado e ao oportunismo, em busca de conforto momentâneo, do mercado que se contenta com emendas na legislação e excepcionalidades mitológicas de um RDC.
Apresentamos a metodologia de demonstrativos de formação do preço por modelagem (DFPM), que parte de composições de custos padrão estruturadas, caracterizando-as ao projeto específico, ao contrato e às condições locais de execução e considerando o impacto de contingências nos fatores de desempenho.
Metodologia de ajustes de Engenharia
A metodologia de ajustes de Engenharia, que se propõe, é a partir de fatores de desempenho médio observados, nas composições padrão de origem, visando à caracterização pelas especificidades previstas no projeto e à avaliação e determinação do impacto das contingências presumíveis a que a execução da obra poderá estar submetida. Assim se obtém uma faixa de valores que apontam admissibilidades, inexequibilidades e exorbitâncias de preços, de modo racional e particularizado. Seguem-se as etapas de procedimentos, considerações, implicações e recomendações, para aplicação dessa metodologia.
Etapa de testes das pré-condições
Estruturação
As composições de custos são estruturadas pelo descritivo da especificação, pela discriminação dos requisitos, dos fatores de desempenho e das premissas técnicas. O teste que se impõe, para a etapa de ajustes, é verificar se a estruturação atende às necessidades do projeto específico.
Revisão
As composições de custos deverão ser revisadas periodicamente, ou seja, adequadas e tratadas estatisticamente a novos levantamentos ou apropriações de campo, a inovações tecnológicas e enquadramento a normas técnicas e regulamentos. O teste que se impõe é de confirmação dos requisitos apontados.
Atualização
A etapa de atualização das composições de custos é resultado de pesquisas de mercado dos recursos técnicos da obra ou dos preços dos insumos, resultando consequentemente na atualização dos custos unitários das composições. O teste que se impõe é de confirmação dos requisitos de atualização.
Etapa de Caracterização
A etapa de Caracterização traz para a realidade e identidade de cada obra, as referências padronizadas. Consiste em adequar as composições padrão de origem às particularidades previstas nos projetos, nas condições locais de execução e nas exigências contratuais. Essas adequações de dimensionamento e parametrização refletem-se nas especificações, nos requisitos, nos fatores de desempenho e nas premissas técnicas das composições, portanto no custo dos serviços. A Composição Caracterizada é o fundamento de todo o processo de modelagem da formação do preço.
Ajustes de Adequação ao Projeto
Conferem às composições de custos a correspondência das especificações de projeto executivo particularizado, requisitos e premissas técnicas pertinentes, adequando-as a recursos técnicos, dimensões, resistências, aproveitamentos, consumos, produtividades, produção e a padrões de acabamento, entre outras possibilidades.
Ajustes de Adequação às Condições Locais de Execução
Conferem às composições de custos a correspondência dos requisitos e premissas técnicas ao levantamento das condições locais da execução da obra, adequando-as e tornando-as representativas dessas condições (reconhecimento da legislação, necessidades especiais de apoio de recursos logísticos e recursos associados, disponibilidade de recursos técnicos, entre outras possibilidades).
Ajustes de Adequação ao Contrato
Conferem às composições de custos a correspondência dos requisitos e premissas técnicas às exigências dos termos contratuais (imposições contratuais, encargos sociais e trabalhistas, gestão diferenciada, necessidades de recursos logísticos associados à mão de obra, ao suprimento de materiais e às máquinas e equipamentos, recursos logísticos alocados por módulos de produção ou grupos de serviços, entre outras possibilidades).
Etapa de Contingenciamento e Racionalização
Composições de Custos Contingenciadas/Racionalizadas
Em função da expertise do construtor e do contratante, que se exime de qualquer ônus, frente a ocorrências presumíveis de restrições, impedimentos e eventuais oportunidades, devem ser consideradas as variações dos impactos das contingências e possibilidades de racionalização nos desempenhos das atividades da execução da obra. Essa etapa é conduzida necessariamente, sobre o suporte técnico das composições caracterizadas, gerando variações e, portanto intervalos de validade e representatividade, a partir da sensibilização dos fatores de desempenho.
Fundamentos das variações de desempenho para produtividade, produção e consumo
O acervo da PINI é composto por mais de 8.000 composições de custos estruturadas. Também apresenta intervalos de variações de produtividades da mão de obra, variações do fator de eficiência de trabalho e operação de equipamentos e variação de consumo de materiais. As variações de desempenhos decorrem do efeito de esforços de racionalização e de impactos de contingências de execução, o que permite formar o preço de obras, por valores mínimos e máximos, gerando intervalos de admissibilidade de preços.
Os estudos com respectivas demonstrações e considerações encontram-se apresentados, no apêndice Variação de Desempenhos.
As composições do acervo PINI são identificadas e tratadas por modelagens geradas estatisticamente. É por meio do acervo PINI que se extraiu um grupo de serviços representativos de determinadas tipologias de edificações e de infraestrutura urbana, para a geração de curvas de sensibilização de desempenhos aos impactos de contingências e efeitos de racionalização, relacionados com o espectro de participação dos recursos técnicos (hH/ mão de obra, hM/ equipamentos e consumo de materiais).
No âmbito da construção de tecnologia convencional, no Brasil, a produtividade da mão de obra, frente aos impactos de contingenciamento, apresenta um limite máximo de perda 150%, com a incidência de homem-hora máxima de 60%, no grupo de serviços. Os ganhos de produtividade, frente aos efeitos da racionalização, apresentam um limite máximo de 50%, igualmente relativo à incidência de homem-hora máxima de 60%.
A modelagem é dada por uma curva de sensibilização da variação percentual da produtividade da mão de obra dada por uma distribuição duplamente assintótica, onde, quanto maior a incidência de homem-hora no serviço, maior a sua sujeição à queda ou aos ganhos de produtividade, mantido o mesmo parâmetro de produção.
No caso dos equipamentos, relaciona-se a variação percentual de impactos na produção (23% a 84%) com a incidência de hora-máquina, no grupo de serviços (hM máxima de 75%, com origem no equipamento dominante).
A modelagem é dada por uma curva de sensibilização da variação percentual da produção de equipamentos, por restrições, frente aos impactos de contingências por condições de operação e de trabalho. Essa curva é uma distribuição duplamente assintótica, onde, quanto maior a incidência de hora-máquina, maior a sujeição do serviço à queda de produção, por impacto de contingências.
Inversamente, a modelagem permite observar o efeito de oportunidades de esforços de racionalização, representados pelo mesmo padrão estatístico, onde, quanto maior a incidência de hM, maiores serão os ganhos de produção.
No caso dos materiais, o intervalo de variação, para o mesmo padrão tecnológico respectivo de edificações e infraestrutura, está entre as médias de consumo observadas e o impacto máximo de contingenciamento, de 18%. A variação de consumo dos materiais não será tratada. Deve, contudo ser verificada caso a caso, seja por razões de controle ou por adesão à causa de redução do desperdício e da racionalização dos processos construtivos.
Finalmente, observa-se que, nos limites de incidência da mão de obra (60%) e do fator de eficiência dos equipamentos (75%), esgotam-se as capacidades de racionalização ou as considerações sobre desempenhos, frente aos impactos das ocorrências de contingências. Esses limites sugerem que a metodologia ou tecnologia devam ser substituídas por alternativas mais eficientes, implicando novo serviço ou atividade, consequentemente, nova composição caracterizada, novo estudo de contingenciamento e novo custo de execução.
Considerações acerca das características dos grupos de serviços predominantes e representativos
Para estudos dessa natureza é essencial que se identifique em cada tipologia, qual a predominância e, portanto representatividade, dos diversos grupos de serviços que compõem a obra. Seguindo essa diretriz, as tipologias selecionadas e estudadas, no acervo PINI, foram obras de edificações e obras de infraestrutura urbana, onde os grupos de serviços, predominantes e representativos, são as estruturas de concreto armado simples, a escavação de valas e a pavimentação asfáltica urbana.
Para as estruturas de concreto armado simples, as características destacadas no grupo de serviços são descritas a seguir.
Elevada presença na tipologia de obras de edificações
Sistema estrutural de utilização corrente
Composta por diversas atividades
Reunião de atividades, com distribuição equânime de recursos técnicos de mão de obra intensiva, materiais intensivos e utilização equipamentos complementares
Atividades e serviços com variadas soluções de projeto (design), processos de execução e de organização da produção
Etapa de obra exaustivamente pesquisada
Igualmente, para a escavação de valas e a pavimentação asfáltica urbana, as características destacadas no grupo de serviços são descritas a seguir.
Elevada presença na tipologia de obras de infraestrutura urbana
Composta por diversas atividades
Reunião de atividades com a utilização intensiva de equipamentos
Reunião de atividades com a distribuição equânime de recursos técnicos de equipamentos, materiais e emprego de mão complementar
Atividades e serviços com variadas soluções de projeto (design), processos de execução e de organização da produção
Etapa de obra exaustivamente pesquisada
Considerações acerca das participações dos recursos técnicos das composições de custos dos grupos de serviços
O recurso técnico dominante no grupo de serviços representativo é que determinará a sujeição dos desempenhos de produtividade da mão de obra ou da produção dos equipamentos aos efeitos dos esforços de racionalização e aos impactos das contingências de execução, em cada tipologia de obra.
É, portanto imprescindível, após a identificação do grupo de serviços representativo de uma determinada tipologia, que se determine a participação do recurso técnico dominante, nas composições de custos.
O critério para essa determinação não deve ser unicamente por incidência financeira no custo, por razões de distorção causada pela constante variação dos preços relativos ou ainda pela incidência majoritária de um determinado material. O critério mais seguro é o de Engenharia, ou seja, apontando a relevância técnica de um determinado recurso, para a execução de um grupo de serviços. Assim sendo, um material ou produto pode ter a maior incidência no custo, mas a exigência de mão de obra qualificada e estratégica, para a sua aplicação, é que vai determinar a relevância desse recurso no grupo de serviços.
As curvas e análise de sensibilização serão próprias do recurso dominante seja ele de mão de obra ou de equipamento, designando as curvas, como de variação de produtividade ou de variação de produção.
Implicações acerca da utilização das curvas de sensibilização das tipologias de edificações e infraestrutura urbana
Dadas as curvas de sensibilização das tipologias de edificações e infraestrutura urbana, onde a participação do recurso técnico no grupo de serviços é função da variação de contingências ou efeito de racionalização, é possível a determinação dos impactos ou efeitos, sobre o fator de desempenho caracterizado.
As tipologias de obras de edificações e de infraestrutura urbana têm grupos de serviços predominantes e representativos, identificáveis por critério de Engenharia
As tipologias de obras de edificações são representadas por serviços com elevada incidência de participação de mão de obra. Essa condição faz com que o efeito de racionalização e os impactos de contingências sensibilizem dominantemente a produtividade, gerando ampla faixa de variação, com valores elevados de impactos ou efeitos, sobre o fator de desempenho caracterizado
As tipologias de obras de infraestrutura urbana são representadas por serviços com elevada incidência de participação de equipamentos. Essa condição faz com que o efeito de racionalização e os impactos de contingências sensibilizem dominantemente a produção, gerando ampla faixa de variação, com valores elevados de impactos ou efeitos, sobre o fator de desempenho caracterizado
Hipótese 1
Outras tipologias de obras terão igualmente grupos de serviços predominantes e representativos e respectivos recursos técnicos dominantes, identificados por critérios de Engenharia. A depender do grupo de serviços, os efeitos de racionalização ou de impactos de contingências sensibilizarão o fator de desempenho caracterizado, por uma função de variação
Hipótese 2
Nas demais tipologias, é lógico considerar que as respectivas amplitudes de variação da incidência da participação da mão de obra e de equipamentos, estarão contidas, nos intervalos de amplitudes de variação gerados para as tipologias de edificações e de infraestrutura urbana, dadas as elevadas incidências de mão de obra e de equipamentos, que essas tipologias apresentam.
Hipótese 3
Nas demais tipologias, também é lógico considerar que as amplitudes de variação dos impactos, sobre o fator, estarão contidas, nos intervalos de amplitude de variação gerados para as tipologias de edificações e infraestrutura urbana, igualmente, dadas as amplitudes de variações de desempenho de mão de obra e de equipamentos, que essas tipologias apresentam
Hipótese 4
Dessa forma, as curvas de sensibilização dos desempenhos de tipologias de edificações e de infraestrutura urbana, contém os limitadores máximos de desempenhos e de incidências de participação, para as demais tipologias. Todas as curvas de sensibilização serão duplamente assintóticas e regidas pela mesma função estatística de variação.
Proposição
A partir dos conceitos que deram suporte à geração das curvas de sensibilização dos desempenhos e das hipóteses acima enunciadas, é possível gerar as curvas de sensibilização de desempenhos para diversas tipologias. As participações dos recursos técnicos nos grupos de serviços determinarão os efeitos da racionalização e os impactos das contingências de obra, representados pela função abaixo apresentada.
Proposição: obtenção e aplicações das curvas típicas de sensibilização da
produtividade nas diversas tipologias de obra
3.1 Produtividade da mão de obra
O critério estabelecido para a obtenção das curvas de sensibilização das diversas tipologias, parte da identificação de pelo menos três arquétipos, por meio de intervalos qualificados de variação da participação da mão de obra, na variação da tipologia edificações (60%). Seguindo essa diretriz, foram estabelecidos os intervalos até 20% de participação, até 40% e até 60%, com as características a seguir definidas.
Produção de equipamentos
O critério estabelecido para a obtenção da curva de sensibilização do fator de eficiência dos equipamentos, parte da identificação de pelo menos três arquétipos, por meio de situações qualificadas de variação das condições de trabalho (condições locais) e de operação (condições de manutenção). Seguindo essa diretriz, foram estabelecidas as condições favoráveis (75%), as condições com restrições (45%) e as condições críticas (12%), com as características a seguir definidas.
Conclusão
A aplicação da Engenharia de Custos, na análise das ações de racionalização e impactos de contingências, determina o grau de variação dos desempenhos, dentro de um intervalo, nas atividades e serviços.
A metodologia inovadora, mas posta em aplicações práticas, se propõe, a partir de composições de custos genéricas, a gerar demonstrativos de formação do preço por modelagem, capazes de caracterizar a obra e incorporar efeitos de esforços de racionalização e impactos presumíveis de contingências, na produtividade da mão de obra, na produção de equipamentos e, consequentemente, no custo das atividades e serviços.
A importância do desenvolvimento dessa metodologia se deve aos seus efeitos técnicos, econômicos e jurídicos, destacadamente no cenário de requalificação da infraestrutura brasileira, onde se divisa um volume de obras sem precedentes, e na utilização de novos referenciais de custos para obras públicas, tornando-os aplicáveis a todas as tipologias de obra, suas condições de execução e sua sujeição a impactos de contingências.
Referências
FREIRE DE CARVALHO, Luiz Raymundo; PINI, Mário Sérgio. Elementos de Engenharia de Custos: Desatando o nó para os agentes de obras públicas na formação de preço para a construção civil [Cost Engineering Elements: Untying the knot for agents of public works for construction pricing]. 1ª. ed. São Paulo: Pini, 2012.
PINI. TCPO: Tabelas de Composições de Preços para Orçamentos [Price Composition Tables for Budget Estimates]. 12ª - 14ª. ed. São Paulo: Pini, 2003; 2012.
Variação de Desempenho, pesquisa aplicada a mais de 100 canteiros de obras de todo o país em 2003, dirigida pelo Departamento de Engenharia Civil da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - USP, cujos resultados foram publicados no TCPO. [Performace Variation, applied research in more than 100 worksites across the country in 2003, led by the Department of Civil Engineering of the Polytechnic School of the University of São Paulo - USP, results were published in the TCPO.]
RICARDO, Hélio Souza; CATALANI, Guilherme. Manual Prático de Escavação[Practical Manual for Escavation]. 2ª - 3ª. ed. São Paulo: Pini, 1990; 2007.